Resumo: O tema Perversão passou por várias
modificações ao longo da sua construção, deixando margem para diversas
interpretações. Através de uma revisão de literatura, e sob uma ótica
psicanalítica, este artigo procurou compilar essas interpretações e fazer um paralelo
entre elas, a fim de verificar a evolução desse construto, bem como elucidar as
principais características desse termo. Através disso, chega-se a esse conjunto
de comportamentos psicossexuais que buscam seu prazer de forma contínua, que é
a perversão.
Palavras-chave: Perversão. Psicanálise. Neurose.
Introdução
O tema Perversão teve diversas
interpretações ao longo da sua construção, deixando margem para conceituações
claras, objetivas e até mesmo denotações pejorativas. A psicanálise, em
especial, construiu todo um aporte teórico sobre a Perversão, levando em conta
a visão predominante da medicina da época, a estruturação da perversão durante
a infância, a diferenciação para com as neuroses e psicoses,
além do seu mecanismo de recusa (Verleugnung).
De forma geral, esse artigo veio
caracterizar a perversão em suas diferentes épocas, concomitante às orientações
psicanalíticas, e de forma específica, verificar a evolução do conceito da
Perversão buscando fazer analogias entre suas diversas interpretações.Para
tanto, foi elaborada uma revisão de literatura a partir da consulta a
documentos, como artigos indexados na base de dados do sítio da internet “scielo”,
periódicos e livros na Universidade Estadual do Piauí e na Universidade Federal
do Piauí.
Ao se analisar a trajetória da perversão
enquanto definição detém-se inicialmente à Medicina, que trazia uma visão
patológica que a caracterizava como um “desvio”. Freud (1905),
em “Três ensaios sobre a teoria da sexualidade", remete à criança enquanto
ser sexual e à sua característica perverso-polimorfa, que pode permanecer no
adulto, trazendo também as neuroses como o “negativo” da perversão. A partir de
1919, Freud começou a relacionar perversão e o complexo de Édipo, o que trouxe
contribuições para os estudos lacanianos da perversão enquanto estrutura
psíquica.
E em 1927, Freud inaugura “O Fetichismo”, que culmina na recusa (Verleugnung) da
castração e nas divisões do ego.
A perversão esboçada em
seu percurso teórico é um construto complexo, que passa por várias etapas para
a construção de um conceito estruturado, passando por “pré-conceitos”; por
juízos de valor, éticos e morais; pela construção dessa estrutura na infância,
dentre outros. Através disso, chega-se a esse conjunto de comportamentos
psicosexuais que buscam seu prazer de forma contínua, considerando a realidade
e ao mesmo tempo a negando, substituindo-a pelo seu próprio desejo.
1. Perversão: um Esboço
Conceitual
É freqüente no discurso de pessoas leigas
uma associação entre perversão e perversidade. Não obstante, a origem do termo
deixa margens para essa associação, pois deriva do verbo latino pervertere, que
remete à noção de "pôr de lado", ou "pôr-se à parte", que
para Aurélio (2001) é "ato ou efeito de perverter (-se); corrupção,
depravação, desvio da normalidade de instinto ou de julgamento, e devido a
distúrbio psíquico."
Esse conceito traz a perversão num sentido moral e
ético, o que nem sempre faz jus à seriedade e à profundidade com que o assunto
merece ser compreendido e analisado. Dessa forma, a escolha da palavra
perversão para nomear um desvio sexual denota um sentido pejorativo, impregnado
de “pré-conceitos”.
É válido lembrar que,
antes da psicanálise, a sexualidade referia-se somente ao conjunto dos atos
ligados à relação sexual, e em especial à reprodução. Freud, de maneira geral,
trouxe uma nova concepção a esse termo, ao dizer que todos os movimentos vitais
tanto tendem à conservação do indivíduo, como comportam um quantum de
satisfação erótica ou de negação dessa forma de prazer. Há libido investida
em todos os atos psíquicos, de uma forma ou de outra.
Dependendo da forma que
essa libido é investida, pode haver prejuízos ao indivíduo, quando este passa a
não mais ter o devido cuidado com a sua integridade física e mental, por
exemplo. Ele, por sua vez, pode até causar prejuízos à sociedade se, além de si
próprio, prejudicar terceiros, ferindo a ordem vigente. O que era considerado
normal para a sociedade, dentro desse contexto, trouxe também à tona aquilo que
é anormal, o que perverte a ordem vigente.
A partir da leitura de
Valas (1990), vê-se que, desde o século XIX, a medicina, representada na época
por grandes psicopatólogos como Krafft-Ebing e Havelock Ellis, aborda esse
termo como classificação de uma enfermidade, ou descrição de algum tipo de
degeneração. Em seus estudos, eles caracterizaram as práticas sexuais que se
desviavam dos padrões éticos e morais para a sociedade através de ligações
entre as perversões e as desordens neurofisiológicas.
Subsidiado por essa
corrente clássica, Freud resolve estudar esses “desvios sexuais” então
descritos somente na ótica médica. Só que de início ele lança sobre as
perversões um julgamento mais moral do que o olhar de um homem de
ciência,correndo então o risco de sujeitar-se às críticas da época, como de
fato ocorreu.
Dessa forma, os estudos
sobre a perversão surgem recheados de conflitos e divergências, e esta aparece
como um construto dinâmico, complexo e de difícil convergência entre as
diversas orientações teóricas que compõem a psicanálise.
Em 1905 esse termo foi
retomado por Freud, que o trouxe para a psicanálise fazendo uma relação à
sexualidade, sem qualquer aporte teórico em conotação pejorativa ou
valorizadora, ou seja, sem emitir juízos de valor, numa linguagem objetiva e
não tendenciosa.
As perversões não são bestialidades nem degenerações no sentido patético
dessas palavras. São o desenvolvimento de germes contidos, em sua totalidade,
na disposição sexual indiferenciada da criança, e cuja supressão ou
redirecionamento para objetivos assexuais mais elevados — sua “sublimação” —
destina-se a fornecer a energia para um grande número de nossas realizações
culturais (FREUD,1905, p.55-56).
Na sua obra "Três
ensaios sobre a teoria da sexualidade" Freud (1905) apresenta pela
primeira vez o conceito de perversão. Trata como a permanência na vida adulta
de características perverso-polimorfas, típicas da sexualidade pré-genital
infantil, em detrimento da sexualidade genital por ele considerada normal.
Em sua obra Freud (1905)
nos traz que é na infância que ocorre a estimulação das zonas erógenas
espalhadas pelo corpo todo, e todas essas práticas constituem a sexualidade
normal de cada indivíduo. Sendo assim a criança é um sujeito sexual que procura
se experimentar e então se descobrir. Para a época, principalmente, e até mesmo
nos dias atuais essas conclusões causam certo impacto.
Mas, centrado no que
formulou, Freud pôde então demonstrar que apesar de poucas vezes uma criança vivenciar
experiências sexuais que os adultos chamam de normais, ela tem inúmeras
práticas que estavam listadas na classificação de perversão. Seja na
masturbação “normal”, nos jogos sexuais ou em seu relacionamento com animais, a
criança é um perverso polimorfo, no sentido de ser capaz de assumir diferentes
formas dentro desse contexto.
2 Neurose, Psicose e
Perversão
Esse polimorfismo das
manifestações da sexualidade infantil e o fato de que seus desvios intrínsecos
se encontram em todos os seres humanos, acaba gerando problemas para Freud, ao
definir perversão. Segundo Valas (1990) Freud formula, então, que para além de
certas manifestações incontestavelmente patológicas (coprofagia, necrofilia),
só pode distinguir a perversão da normalidade porque perversão se caracteriza
por uma fixação prevalente, até mesmo total, do desvio quanto ao objeto, e pela
exclusividade da prática quanto ao desvio com relação ao objeto. Esse
comportamento também entra nessa categoria quando causa sofrimento clinicamente
significativo ou prejuízo na vida do indivíduo e/ou conflitos com terceiros.
Freud (1905) então
observou que há adultos que se mantêm na prática de um ou outro comportamento
sexual de forma exclusiva, muito mais como defesa do que como grande capacidade
de sustentar a liberdade sexual, pois em sua infância as diversas correntes da
sexualidade coexistiam sem um eixo organizador que as aglutinasse e
subordinasse em torno de si. Desse modo, a continuidade de uma sexualidade
infantil perverso polimorfa contextualizaria o perverso.
Como diz Ferraz (2002,
p.25):
O que diferencia a sexualidade infantil daquela do perverso é o fato de
que, na criança, tudo ainda é apenas potencialidade. Nenhum eixo organizador,
tirânico, dominou a cena sexual. No adulto perverso, ao contrário, a
sexualidade está definida e cristalizada: um eixo pré-genital preside a vida
sexual, tão despoticamente quanto a genitalidade o faz na vida sexual
"normal".
Por diversos motivos, sejam eles
constitucionais ou exteriores, a pulsão sexual pode conduzir a desvios,
como neuroses, psicoses ou perversões. A neurose se apresenta como “um
recalcamento sexual que ultrapassava a medida do normal”. Freud (1905), no caso
Dora, definiu as neuroses como o “negativo” da perversão, pois nas neuroses os
impulsos pervertidos, após terem sido reprimidos, manifestam-se a partir da
parte inconsciente da mente, uma vez que, em ambas as estruturas psíquicas
existem determinações e formulações bem distintas uma da outra, no que se
referem a mecanismos de defesa, modos de manifestações, entre outras. Porém,
ambas são iguais em um aspecto: têm sua origem na sexualidade infantil.
Tudo começa a se
definir, diante da comparação entre a neurose e a perversão, já que Freud
(1905) assume as divergências entre as duas estruturas como processos distintos
de construção psíquica. O que realmente começa a ser identificado é que,
enquanto os neuróticos funcionam psiquicamente adequando o ego às exigências do
ambiente, recalcando conteúdos conflitantes e angustiantes, no psicótico, o ego
fica à mercê do id, sujeitando-se a ele, rejeitando a realidade, apropriando-se
de uma realidade substituta, onde ocorreriam as alucinações e os delírios. Na
perversão, o desejo aparece como vontade de gozo, e o ato é praticado
geralmente como vitorioso, isento de culpa. O perverso sabe o que quer,
enquanto o neurótico reprime esse desejo.
No que tange ao aparelho
psíquico do perverso, surge uma nova formatação, diferente dos neuróticos e
psicóticos. Agora o ego negocia suas exigências com os desejos do id e com a
realidade. Os perversos colocam em prática aquilo que os neuróticos não têm
coragem de manifestar. Inclusive, estes reprimem, recalcam muitos dos atos
característicos dos perversos, isto é, na perversão é possível considerar, ao
mesmo tempo, as exigências do id e as da realidade, sem que uma anule ou
interfira na outra. Não há nem o recalcamento dos desejos, como ocorre na
neurose, nem rejeição à realidade, como ocorre na psicose (AULAGNIER-SPAIRANI,
1967).
Logo, pode-se entender
que a neurose esconde um desejo perverso, encoberto pelo sintoma, e a partir
deste ponto de vista, com o auxílio da psicanálise, podemos reconhecer que
todos nós temos um conjunto de neuroses, e da mesma forma, passamos assim a
perceber a perversão como característica que pode ser descoberta, até mesmo no
sujeito dito normal ou saudável. Também no adulto que já “conquistou” a
maturidade podem conservar-se em sua personalidade (em um lugar secreto) partes
infantilizadas que se revelam em situações de hiperexcitação, ou mesmo no
prognóstico da perda do objeto amado.
3. Perversão e Estrutura
A partir de 1919, Freud começou a relacionar
perversão e Édipo nos textos "Uma criança é espancada: Contribuição ao
estudo da origem das perversões”, "A dissolução do complexo de
Édipo”, e "A organização genital infantil: uma interpolação na
teoria da sexualidade". Nesses textos, ele procura responder a questão
da perversão a partir da articulação entre o complexo de Édipo e o complexo de
castração, o que proporciona um avanço considerável na solidificação dos seus
estudos.
No entanto, é Lacan quem
inaugura uma psicanálise na qual a perversão se coloca como um paradigma
estrutural, mesmo que essa noção não admita uma só interpretação, trazendo o
conceito de estrutura como um “conjunto de elementos que se constituem na
relação, que são exclusivamente interdependentes e que se regem por determinadas
leis que fazem parte de uma constituição interna”.
Lacan remonta o complexo
de Édipo como uma estrutura intersubjetiva que produz efeitos de representação
nos personagens que a integram, evidenciados pela localização que cada um
norteia em função do falo.
Conforme Andrade (1992),
a dinâmica edipiana se desenvolve movida pela dialética do ser e do ter,
segundo a qual o sujeito parte de uma posição onde ele é identificado ao falo
da mãe para uma outra posição, onde ele, tendo renunciado a esta identificação
pela aceitação da castração simbólica, tende a identificar-se seja àquele que é
suposto ter o falo (pai), seja àquela que é suposta não o ter (mãe). Esta
operação se atualiza graças a um processo de simbolização inaugural: a metáfora
do Nome-do-Pai.
Essa metáfora lacaniana
contextualizada em um foco cristão mostra que o Nome-do-Pai é o significante
que substitui a simbolização do sujeito na presença ou ausência da mãe.
Concomitante, ao analisar a obra de Freud, podemos destrinchar a participação
do pai numa constituição da realidade psíquica, o que é uma encruzilhada
estrutural do sujeito. Lacan então tomou como base esse legado freudiano e
acrescentou o Nome-do-Pai como um elemento significante, além de agora
apresentar o Falo na constituição edipiana, já que é impossível tratar-se de
estrutura psíquica sem agregar a questão fálica.
De acordo com Andrade
(1992), uma criança, especialmente na primeira infância, se apresenta em sua
coleção de reflexos como sendo o único objeto de desejo da mãe. Logo essa
criança exerce uma reciprocidade muito grande para com seus cuidados maternos.
A mãe é a detentora do poder, ela é capaz de suprir todas as carências do
infanto. Nesse cenário, o gozo, na maioria das vezes, é propiciado de forma
natural e intensa. Ele mescla além de necessidades orgânicas, um prazer
determinante em suas relações de afeto.
Por se apresentar de
forma tão sobressalente, a mãe vem a ocupar o lugar do Outro simbólico na
estrutura psíquica da criança, que já reconhece o poder de gozo e a onipotência
da mãe. Dessa forma, o desejo da criança será então o desejo do Outro.
O Outro, aqui
representado pela mãe, é o ditador desse desejo infantil, e quando a criança se
percebe desse fato, além de visualizar que a mãe possui outro desejo que não
mais a sua vontade, acaba entrando em grande conflito de identidade, visto que
agora a figura paterna é o alvo da mãe.
É nesse tocante que se
avaliam as frustrações e angústias da criança, que pode então procurar novas
formas de desejo do Outro, vivenciando então a castração. O pai simbólico é um
rival, e isso pode representar uma intensa perturbação no filho que precisa da
mãe para resignificar seus objetos de desejo.
Andrade (1992) fala que,
não obstante, se por algum contratempo esse estado de perturbação e angústia é
anulado ou danificado, a dinâmica edipiana tente a se cristalizar numa forma
peculiar de economia de desejo, formando assim uma estrutura perversa.
O indivíduo na perversão se fecha numa
representação que não pôde atribuir um significado ao que não estava presente,
ao que não identificou, e assim se impossibilita de entender a
castração. E essa ineficácia traz confusão na descoberta do desejo no infanto.
Em suma, o perverso
despeja na castração a resposta para a falta do pênis da mãe, e esse processo
de castrar na visão da criança foi realizado pelo pai, que forçou essa união
com a sua mulher (mãe) e demonstrou assim todo o seu poderio.
4. Fetiche e a Recusa da
Perversão
No trabalho “O Fetichismo”, Freud (1927)
coloca o fetiche como substituto para o pênis da mulher (mãe), sendo a recusa (Verleugnung) dessa
percepção traumática o mecanismo psíquico de defesa utilizado na perversão. A
mesma está presente na constituição de qualquer psiquismo, como uma forma
inicial na elaboração de mecanismos de defesa do psiquismo.
De forma enfática, é
durante as faltas da mãe que o falo assume a função de satisfação de desejo e o
fetiche é então um substituto do pênis, um substituto fálico atribuído como
símbolo pela criança à mãe. Freud apresenta o fetichismo como sendo uma espécie
de modelo geral por seus elementos invariantes, sustentando-se, portanto, como
uma estrutura psíquica.
Freud, segundo Valas
(1990), indica que o fetiche não tem a menor necessidade de parecer com os
órgãos genitais, nem com outros objetos que reproduzam a forma do pênis,
representando-o. Para que a representação no objeto do fetiche seja
satisfatória, é preciso que esse objeto seja próximo ou estabeleça alguma
relação de proximidade com o objeto real de desejo. Como demonstra também o seu
modo de surgimento, convém precisar que o fetiche não é o falo, mas o véu por
trás do qual se deixa esboçar a possibilidade de sua presença oculta. É daí que
se origina, além disso, o valor erótico do véu, sempre presente não apenas no
exercício do fetiche, mas de todas as perversões.
Seguindo essa linha de
pensamento pôde-se perceber que o fetiche não se atém ao falo propriamente
dito, mas sim às angústias e frustrações vivenciadas na castração. Seria como
um “véu” metaforizado por Valas (1990), o qual remonta por trás de uma
estrutura edipiana um valor de cunho erótico. Assim, o “véu” funcionaria como
uma barreira, algo entre o que está aparente e o que representaria através da
realidade inconsciente.
Buscando facilitar a análise
teórico-clínica da perversão, Freud procurou entender mais sobre os “véus” que
se ocultavam na formatação psíquica do perverso. Assim, a recusa (Verleugnung) se
apresentaria de forma mais detalhada como um processo de defesa e de construção
do fetiche, sendo este um substituto do pênis materno, isto é, o sujeito
enxerga e nega ao mesmo tempo a constatação da ausência de pênis na mãe. É a
partir daí que passamos a entender a especificidade do modo de relação do
perverso com a realidade. A recusa da realidade consiste na recusa em aceitar a
ausência do pênis na mulher (mãe) emparelhada às frustrações e angústias do
infanto ainda na ameaça dessa perda.
Na sua obra “Clivagem do
ego no processo de defesa”, Freud (1940) reforça esse raciocínio trazendo de
forma detalhada a concepção de que há uma clivagem intrapsíquica que permite a
coexistência de duas realidades inconciliáveis que jamais se influenciam.
Enquanto uma considera a realidade, a outra a nega, substituindo-a pelo seu
próprio desejo. Assim, o perverso conseguiria viver uma vida aparentemente
normal segundo os parâmetros da sociedade e ao mesmo tempo manter
comportamentos considerados inaceitáveis segundo a norma social.
O incomum, o inesperado
e o que costuma estar fora de um padrão ou de regras pré-estabelecidos pela
sociedade geralmente chamam a atenção, podendo causar espanto, medo,
curiosidade. A ciência, por assim dizer, tem em suas linhas de ação as
tentativas de explicar esse incomum. Porém, o que é “normal” geralmente não
fornece problemas à sociedade, estando integrado às leis, normas e regras,
explícitas ou não. Dessa forma, o que é considerado normal dependerá da cultura
e da sociedade em que se está inserido, bem como as reações e conseqüências
acerca daquilo que for considerado fora desse padrão, estando aí conectada a
questão da escolha sobre enfrentar ou não essas conseqüências.
Isso faz jus à
classificação que Freud (1905) traz da perversão, em seu livro "Três
ensaios sobre a teoria da sexualidade", em que “as perversões são ou
transgressões anatômicas quanto às regiões do corpo destinadas à união sexual,
ou demoras nas relações intermediárias com o objeto sexual, que normalmente
seriam atravessadas com rapidez a caminho do alvo sexual final”.
Porém, esses conceitos
trazem à tona duas questões que se interligam necessariamente: por um lado, a
aprendizagem, os significados atribuídos ao conceito de normalidade
subordinam-se àquilo que foi recebido da sociedade, da cultura, das
instituições em que o indivíduo está inserido. Por outro lado, os significados
se processam e se transformam a partir das ações e pensamentos do próprio
indivíduo, fazendo com que este se torne aquilo que ele é, nesse caso, perverso
ou não.
Em outras palavras,
somos produto de nossas experiências, vivências, adquirindo um “sentido
pessoal” acerca de tudo isso. Caberia a nós, portanto, a atribuição de
significado daquilo que chega a nós, sendo necessário discernir e escolher as
normas e o perverso para nossas vidas.
Considerações Finais
Visto que os conceitos apresentados sobre
perversão passaram por alguns desconcertos impregnados de doses moralistas, e
apesar das inúmeras controvérsias ideológicas, cabe aqui considerar a perversão
como um conjunto de comportamentos psicosexuais que buscam um prazer de forma
contínua.
Essa estrutura da
personalidade inicia-se a partir da infância, pois a criança é um sujeito
sexual que constantemente se experimenta e então se descobre. A partir daí,
desse experimentar e descobrir, é que encontramos a distinção da perversão para
com a normalidade. A perversão se caracteriza por uma fixação do desvio quanto
ao objeto de desejo, e pela exclusividade de sua prática. Essa sexualidade
estaria definida e cristalizada, por conta de um prejuízo na estruturação do
Édipo na vida da criança. O perverso sabe o que quer, sabe o foco do seu
desejo, mas nega a raiz de onde ele se originou, considerando a realidade e ao
mesmo tempo a negando, substituindo-a pelo seu próprio desejo.
Cabe então ao próprio
indivíduo, dentro da sua sociedade, relacionar e discernir o normal e o
“pervertido”, já que o “aceitável” nada mais é que uma convenção social.
Conforme aprendemos com Freud, somos necessariamente seres sexuais,
transferindo, recalcando, liberando nossa libido, e variando inclusive nosso
objeto de interesse ao longo da vida, estando ele dentro da perversão, ou não.
Fonte: psicologado
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