Autor: Brígida K. P. Kapella Nhantumbo
I. Introdução:
A
Província do Niassa conta com cerca de 146 Unidades Sanitárias, O rácio
habitante por Unidade Sanitária é de 7.740,
o raio teórico de acção reduziu de 52.6Km, para 51,6. No entanto a dispersão da população continua a desafiar essa
taxa. Em geral, que verificou-se um crescimento assinalável no acesso aos
cuidados de saúde por parte da população da Província do Niassa apesar da
persistência de doenças endémicas como são os casos da Malária, a Tuberculose e
o HIV e SIDA (Direcção
Provincial de Saúde do Niassa 2010).
A
Saúde da População de Niassa nos últimos 4 anos caracterizou-se
fundamentalmente pelo aumento de casos de Malária, de disenteria e de diarreias. O saneamento do meio continua
deficiente.
A disponibilidade de latrinas é ainda baixa, uma latrina melhorada esta para cerca de 13 agregados familiares. Cada fonte de água na zona rural está para 103 agregados familiares (Direcção Provincial de Saúde do Niassa 2010)
A disponibilidade de latrinas é ainda baixa, uma latrina melhorada esta para cerca de 13 agregados familiares. Cada fonte de água na zona rural está para 103 agregados familiares (Direcção Provincial de Saúde do Niassa 2010)
A
situação nutricional da Província registou ligeiras melhorias segundo os
Indicadores da Vigilância Nutricional (o Mau Crescimento e Baixo Peso ao Nascer
).O volume de actividades medidas em Unidades de atendimento decresceu, com
particular destaque para as Vacinações (6%), consultas externas (8%). Os
recursos humanos insuficientes aliados a deficiências no sistema de gestão
continuam a ser os maiores desafios para os próximos tempos no funcionamento do
sector Saúde na Província do Niassa (Direcção
Provincial de Saúde do Niassa 2010).
I.1.
Breve Historial
Os serviços de Saúde Mental no Niassa iniciaram as suas
actividades em 1996 com 2 técnicos de psiquiatria e saúde mental (1 no Hospital
Provincial de Lichinga e outro no Hospital rural de Cuamba), as 2 Unidades
Sanitárias de referência na província. Antigamente, os casos de doenças mentais
eram tratados nas consultas de medicina geral ou eram transferidos para o
Hospital Psiquiátrico de Nampula.
Cerca de 2 anos depois, a província recebeu 3 novos
técnicos de psiquiatria e saúde mental, o que permitiu expandir as actividades.
Assim, os distritos de Mandimba, Mecanhelas e Marrupa passaram a contar com
estes serviços. Integrados nos serviços de medicina geral, os técnicos para
além de prestar serviços nas consultas externas, trabalham em coordenação com
os outros programas da saúde da comunidade.
Em 2005, o programa passou a contar com uma psicóloga
clínica e em 2006, iniciou com os serviços de psicologia no Hospital Provincial
de Lichinga (HPL). Para além das consultas e avaliações psicológicas,
introduziu-se nos finais de 2006, os serviços de psicoterapias sócioemocionais
externas, que numa primeira fase tinham como grupo alvo, apenas os doentes
internados no HPL. Em 2007, começaram a abranger pacientes em ambulatório e
pacientes transferidos dos Serviços Amigos de Adolescentes e Jovens (SAAJ).
As terapias sócioemocionais externas, são terapias de grupo
feitas fora do ambiente hospitalar cujo objectivo fundamental é para além o
apoio emocional e manutenção da auto-estima dos pacientes com base em
dinâmicas, colocar os pacientes em contacto com outras realidades sociais
diferentes do ambiente de hospital, eliminar os sintomas depressivos e
desenvolver a vontade de cura rápida para voltar ao convívio social que vão
apreciando.
A maioria das pessoas vive numa permanente busca de um
ajustamento saudável em suas relações pessoais, familiares, sociais e
profissionais. No ambiente hospitalar, apesar das diversidades das histórias
individuais que culminam com a decisão médica de internamento para a sua
recuperação ou melhor seguimento, existe em comum a busca frequente da
recuperação, processo que para ser bem-sucedido, exige autoconhecimento, uso
maduro de emoções ou motivação, capacidade de lidar com os próprios conflitos e
atendimento humanizado para além da medicação prescrita e administrada
diariamente (Gaudêncio 2011).
A depressão é vista por Winnicott
(1999) como uma componente da psicopatologia manifestando-se de forma severa e
incapacitante, e durar a vida inteira. Nos indivíduos relativamente saudáveis,
geralmente é um estado de humor passageiro. É assim vista como em fenómeno
comum e até certo ponto universal, que se relaciona com o luto, com a
capacidade de sentir culpa e com o processo de maturação. É um processo
fenomenal que implica uma força do ego, tende a sumir e a pessoa deprimida
tende a se recuperar para a saúde mental (Winniccot 1999).
Em 2007, foi assinado um
memorando de entendimento entre a Direcção Provincial de Saúde do Niassa, o
Conselho Municipal da Cidade de Lichinga e o Instituto Nacional de Segurança
Social (INAS), com o objectivo de fazer o seguimento e ajudar na devolução dos
pacientes as suas residências ou ambiente familiar, evitando deste modo a
presença de doentes nas artérias das cidades, vilas e mercados da Província,
como consequência de recaídas e/ou falta de suporte psicossocial.
Em 2009, a província
recebe mais 2 técnicas psiquiatria e saúde mental, o que permitiu expandir os
serviços para o distrito de Maúa, a sul do Niassa. Em 2010, os serviços
iniciaram no distrito do Lago. Devido a insuficiência de recursos humanos da
área, os restantes distritos da província são cobertos pelos técnicos
existentes, que de forma rotativa, de 3 em 3 meses, visitam estes locais e
fazem as consultas e/ou seguimento.
II. Actividades
desenvolvidas
Toda e qualquer intervenção deve ter em
conta o cuidador e o cuidado, de modo a respeitar as suas convicções e
introduzir mudanças de forma gradual, sem criticar nem menospresar nada nem
ninguém. No caso de intervenções nas comunidades e ao nível hospitalar, é
importante traçar estratégias que tenham como princípio que nenhuma cultura é
melhor que outra, existem apenas diversidades que devem ser respeitadas e não
censuradas (Said and Figueroa 2008). Os trabalhos dos profissionais de
saúde mental no Niassa, não foge a esta regra, daí a pertinência de rever estes
conceitos.
O
cuidado: significa
atenção, precaução, cautela, dedicação, carinho, encargo e responsabilidade.
Cuidar de alguém é servir, é oferecer ao outro, em forma de serviço, o
resultado de seus talentos, preparos e escolhas, é praticar o cuidado. Cuidar
de alguém é perceber a outra pessoa tal como ele é (perceber suas limitações,
gestos, concepções, dor, alegria, conhecimentos, criatividade, ideias, em fim,
perceber os hábitos, as vivências, as particularidades e intimidades, etc) (Fonseca and Da silveira 2008).
O
autocuidado:
significa cuidar de si próprio, são atitudes, comportamentos que a pessoa tem
em seu próprio beneficio, com o objectivo de promover a sua própria saúde,
preserva-la, manter a vida independentemente de qualquer tipo de obstáculo que
tenha na frente por vencer (Said and Figueroa 2008).
O
cuidador: é um ser humano
com qualidades especiais, transmitidas pelo forte traço de amor à humanidade,
de solidariedade e de doação (Said and Figueroa 2008). Em seguida, algumas tarefas que fazem
parte da rotina diária de um cuidador:
ü Actuar como ele de ligação entre a
pessoa cuidada, a família e a equipa de saúde,
ü Escutar, estar atento e ser solidário
com a pessoa cuidada,
ü Aconselhar e dar apoio sócioemocional
sempre que necessário,
ü Ajudar nos cuidados de higiene sempre
que necessário,
ü Estimular e ajudar na alimentação,
ü Ajudar na locomoção e actividades
físicas tais como: andar, tomar sol e efectuar exercícios físicos,
ü Estimular actividades de lazer e
ocupacionais,
ü Administrar as medicações, conforme a prescrição
e orientação médica
ü Dar informação suficiente sobre os
cuidados que o doente precisa ter consigo mesmo,
ü Dar informações sobre os comportamentos
de risco que o doente deve evitar,
As actividades de saúde mental,
requerem não apenas os aspectos acima descritos, como também uma enorme vontade
de ensinar e aprender. Nos primeiros anos, o programa teve muitas dificuldades
pois muita gente pensava que este serviço é destinado apenas aos doentes
mentais, vulgarmente apelidados de “malucos”, termo que foi gradualmente
eliminado, principalmente no ambiente familiar dos doentes, como resultado das
campanhas de IEC associadas as visitas domiciliárias feitas pelos técnicos.
No entanto, as campanhas de IEC também
tiveram algumas dificuldades, principalmente no que diz respeito as
terminologias das patologias mas frequentes como por exemplo a Epilepsia, que
em cada região do Niassa, tem a sua designação e estratégia de tratamento. Os
profissionais tiverem que fazer um trabalho junto dos membros influentes, para
aprender estes termos, de modo a facilitar a comunicação com a comunidade.
De
um modo geral, nos últimos 4 anos os casos novos de transtornos Neurológicos,
mentais e comportamentais, aumentaram em resposta as campanhas de Informação, Educação
e Comunicação em Saúde Mental realizadas nas comunidades, Escolas e nos
trabalhadores de Saúde que permitiu o aumento de conhecimentos em relação as
doenças mentais que se tratam nas
Unidades Sanitárias.
A
figura 1, apresenta o dados das inspecções sanitárias desenvolvidas nas escolas
em coordenação com o programa de saúde escolar e do adolescente. Importa
sublinhar que o trabalho feito nas escolas influi igualmente palestras com
alunos, professores, pais e encarregados de educação. Esta actividade, deve um
papel importante na descoberta de crianças que eram impedidas e ir a escola e
ter uma vida normal por serem epilépticas.
Figura 1: Dados do trabalho de inspecções sanitárias nas escolas no período 2006-2009
Figura 1: Dados do trabalho de inspecções sanitárias nas escolas no período 2006-2009
Fonte:
DPS/Niassa_2009
Na
tabela 1, estão representados os indicadores de serviços de Saúde mental nos
últimos 5 anos. A redução das primeiras consultas e seguintes, deveu-se também
a melhor assistência dos doentes no tratamento e na toma da medicação, uma vez
que estes pacientes devem ser medicados e monitorizados. No caso dos doentes
crónicos, são feitas visitas domiciliarias uma vez por mês, nos distritos onde
há técnico de psiquiatria e saúde mental permanente e de 3 em 3 meses, nos
outros distritos.
Tabela 1: Indicadores de serviços de Saúde Mental
Indicadores
|
2005
|
2006
|
2007
|
2008
|
2009
|
Cresc
|
Casos
novos de transtornos Neurológicos, mentais e comportamentais
|
2.731
|
3.053
|
3.399
|
2.003
|
2.835
|
41.5%
|
Disponibilidades
de serviço de Psiquiatria nos Hospitais Provinciais ( camas, Serviços).
|
12
|
12
|
12
|
12
|
12
|
0
|
Nº
de triadores da US de nível primário em S.Mental
|
0
|
3
|
3
|
13
|
13
|
0
|
Fonte: DPS/Niassa_2009[1]
Os
distritos com alta cobertura de consultas foram. Cuamba e Lichinga Cidade,
devido a disponibilidade de medicamentos. Contudo, a dificuldade de transporte
para a deslocação dos técnicos as comunidades, associados a outros factores de
ordem administrativa, contribuíram para as baixas coberturas nas consultas
registadas nos distritos de Mecanhelas, Mandimba e Marrupa (Direcção
Provincial de Saúde do Niassa 2009)
Na área de psicologia, as consultas são
feitas no Hospital Provincial de Lichinga todas as manhãs de segunda a sexta
feira, avaliações (sempre que necessário ou quando estas são solicitadas pelos
outros sectores ou outras instituições). Nos sábados de manha, são feitas as
psicoterapias socioemocionas externas. Neste serviços, são atendidos doentes de
todas as idades, apesar de os domingos, estarem reservados a actividades
específicas na pediatria do HPL.
No
serviço de Psicologia, foram atendidos num total de 3.502 pacientes ( 2009) e
2.708 pacientes em( 2.008 ) com uma evolução de 11,7%. Nas primeiras consultas, foram vistos 178
pacientes em 2009 contra os 162 de 2008, o que representa um aumento na ordem
de 10% na procura destes serviços pelos utentes, conforme se pode observar na
tabela 2.
A
faixa etária dos 10 aos 20 anos, é a que mais procura estes serviços. Até ao
momento, no HPL não existem espaços
específicos para as Terapias Ocupacionais.
Tabela 2: Movimento das 1ªs consultas
de psicologia 2008-2009
F.Etária
|
1ªs
Consul/08
|
1º
Consultas/09
|
Evol.1ºs
Consultas (08/09)
|
0-10
|
41
|
36
|
0.12
|
10_20
|
79
|
76
|
0.04
|
20-30
|
24
|
34
|
0.42
|
>30
|
18
|
32
|
0.78
|
Total
|
162
|
178
|
0.10
|
Fonte:
DPS/Niassa_2009
III. Conclusão:
Nos últimos 5 anos, os
serviços de Saúde mental no Niassa, registaram inúmeros avanços a todos os
níveis com particular destaque para expansão das áreas de cobertura e o
trabalho nas comunidades (Informação, Educação e Comunicação(IEC), visitas
domiciliárias e trabalhos com as autoridades tradicionais locais, incluindo os
curandeiros/praticantes de medicina tradicional). Contudo, ainda há muito por
aprender e por fazer, começando pelo aumento e capacitação dos recursos humanos
da área.
Referências bibliográficas
- Direcção Provincial de Saúde do Niassa (2009).
Relatório anual de prestação de contas 2008. Lichinga.
- Direcção
Provincial de Saúde do Niassa (2010). Relatório Anual de Prestação de
contas 2009. Lichinga.
- Fonseca,
A. C. and E. R. Da silveira (2008). Guia prático do cuidador.
Brasília, Ministério da Saúde Brasileiro.
- Gaudêncio,
P. (2011). "Terapia Clínica." from http://www.paulogaudencio.com.br/top-terapia3.html.
- Said, R. and M. E. Figueroa
(2008). Relacionamentos
múltiplos e concorrentes: diálogos ausentes em contexto de risco para o
HIV. Maputo,
Johns Hopkins University/bloomberg School of public health/center for
communication programs.
- Winniccot,
D. W. (1999). Tudo começa em casa. Trad. de Paulo Sandler. São
Paulo, Martins fontes.
Fonte oral:
Jacinto Ncuna, responsável provincial
de saúde mental no Niassa.
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